quarta-feira, 6 de março de 2013


 O carnaval, o papa, o Oscar ...

 

Ana Vargas

Juro que eu não queria escrever sobre as coisas de um modo enfadado ou amargo, então, tentarei.


Passou o carnaval, o papa renunciou, o tal Oscar já divulgou seus eleitos e estes três eventos marcaram o mês que se foi.


Pois é (ou pois então, como dizemos nas Gerais) diante de tais acontecimentos eu fiquei pensando...


Primeiro, o carnaval, festa da qual nunca gostei sei lá por que -  acho que é por que desde que me lembro, gostar de rock; e por ser apenas mais uma moça latino-americana que se deixou influenciar pelos modos de vida do ‘império’ rs. Sim, sei exatamente como escrever isso soa antiquado, bobo e contraditório. Por um lado, eu sempre critiquei a americanização do Brasil, essa mania de cultuar tudo que é feito ‘lá’. Fico brava quando vejo, por exemplo, a língua inglesa sendo usada em tudo quanto é lugar: desde os benditos nomes de edifícios que se pretendem chiques (?!) até as coisas mais banais como a designação de algumas profissões: por exemplo, porque dizer  ‘hair stylist’ ao invés de cabeleireiro?



Ao mesmo tempo, hoje, com a idade avançada e alguma leitura, a gente sabe que há muito mais por trás dessa (ainda?) supremacia norte-americana: eles são inegavelmente esforçados e desde que resolveram se tornar um país, levaram isso muito a sério (ao contrário de nós, que ainda tateamos, mas isso é outro assunto) e esse pensamento (uma utopia necessária quando se quer fazer coisas, seja um país, um livro ou sei lá, uma receita de bolo) atravessou e impregnou tudo o que forma o tal jeito norte-americano de viver. Ah, e eles se acham ótimos, os melhores: problemas de autoestima em relação a pátria, eles (a maioria, pelo menos) não parecem ter.


Bom, mas não vou me alongar nisso – não sou o Roberto da Matta nem nenhum desses estudiosos que escrevem na grande imprensa sobre essas coisas – sei é que o rock que nasceu do blues e que era, por sua vez,  a música dos escravos norte-americanos*, com seus lamentos cantados, tão tristes e tão belos, sempre me fez pensar: nasci no país errado. Mas eu achava que o meu país devia ser a Inglaterra e não os EUA (quantas besteiras a gente pensa quando tem uns 13 ou 14 anos). Na verdade,  sempre achei meio bregas certas coisas vindas de ‘lá’ que os da minha idade idolatravam, como a Madonna, por exemplo.


Ah, sim, e o carnaval, onde entra nisso? Entra assim: os sambistas que eu gosto – Cartola, em primeiro lugar – fazem músicas tristonhas e, embora, eles sejam (claro) filhos de tudo que engendrou o carnaval brasileiro, imagino que nem eles gostariam de ver no que se transformou essa...  festa**: um desfile interminável de bundas e peitos siliconados, um culto exagerado ao corpo e tudo isso orquestrado pelas redes de tevê... 

Enfim, todo ano assistimos ao mesmo filme e pelo que lembro, isso já vem sendo aprimorado (digo, a ruindade disso) desde o final dos anos 70 (pois eu me  recordo das transmissões carnavalescas do tempo da infância e já as achava deprimentes).


Sobre o carnaval, muitíssimo melhor do que eu (sem dúvida) escreveu o mestre Drummond em um dos seus poemas nos idos anos 1960 -  isto aqui:

O que passou


Há palavras que restam sem  substância,

Que foi feito do conteúdo da folia?

(...) Em Momo quem acredita nestes hojes? (...)

Mas o umbigo subsiste e resiste. As nádegas também. O carnaval agarra-se a redondas redundâncias para sobreviver.





E a mim, do  alto da minha ‘sabedoria carnavalesca’, só me resta dizer amém ao poeta e assistir (penalizada ou enojada ou resignada) à sobrevivência do carnaval aí pelos anos vindouros, um desfile cansativo de caras que se esforçam para aparentar uma falsa alegria (tão falsa que já não está surtindo efeito).



E o  Papa, hein?!


Muita gente culta e especialista em religiões, histórias, filosofias e nas variadas ciências mundanas escreveu com sapiência sobre a renúncia do papa. Dizem que ele está cansado, que ele não aguentou a burocracia católica, que queria uma coisa enquanto os donos do poder, de fato, nas entranhas do catolicismo, queriam outra e por aí afora. Tenho formação católica como, sei lá, 90% dos mineiros (?), mas nunca consegui enxergar Deus ali nos tantos rituais católicos (embora ache alguns bonitos), talvez a renúncia do papa queira nos dizer isso: Deus não está ali... Quem sabe?




O tal do Oscar


As mais belas mulheres (?), os filmes mais caros,  as histórias que alimentam a imprensa mundial, o diz que diz dos bastidores: todo ano é a mesma coisa. Spielberg faz um filme sobre um mito americano (porque existem heróis por ali em profusão ou seja: há material farto para muiiiiiiiitos filmes pelos próximos 100 anos), a nova queridinha das telas (‘ela era pobre ou já nasceu rica; é simpática ou chata, nem é tão bonita assim , é super- simples; como alardeia a mídia sensacionalista), quem traiu quem... E assim, uma indústria (do cinema) alimenta outra (a mídia) e diante de ambas, nós todos ficamos como os antigos homens das cavernas olhando pra’s paredes. Alguns ficam mesmo imbecilizados – o cerco é grande: veja o filme, compre a revista, assista ao trailer e isso e aquilo – e quantas de nós, mulheres,não nos sentimos nadas diante daquelas atrizes que são produzidas e vendidas pela indústria do cinema -  digo, do cinema norte-americano, bem entendido -  como as ‘mais, mais e etc.”.
De tudo isso o que será que é realmente, verdadeiramente bom, no meio de tanta porcaria oscarizada? O pior é saber que esse modo de fazer cinema que já está dando – há tempos – sinais de que precisa ser renovado***; está sendo, agora, em pleno século XXI, copiado ipsis literis, por certa rede de tevê tupiniquim. É tudo igualzinho ao que é feito ‘lá’, digo, ao pior que é feito ‘lá’.
Mas...




Apesar disso, há gente boa fazendo cinema aqui no Brasil e ‘lá’, sem as mega produções, sem a estrela da vez, apenas com uma boa história para contar (afinal, cinema não é isso?)



E assim, enquanto as águas vão fechando o mês, entre as tragédias anuais de sempre; a maior cidade do Brasil é novamente alagada, e os pobres que moram nos morros vão sendo soterrados; enquanto a Quaresma impera no calendário e (ainda) no coração dos mais puros ou dos mais alienados...


Ana Vargas




Enquanto eu puder ver paisagens como essa****   eu vou acreditar que para além das tantas  indústrias que transformaram  o carnaval brasileiro e o cinema norte-americano em coisas repetitivas e chatas; e de certa forma, também fizeram o mesmo com a fé de tantas pessoas...




Há algo bem maior que sustenta e fortalece a essência verdadeira da vida como um todo e que faz com que a gente ainda procure Deus, fora das religiões; e bons filmes, feitos aqui, na Croácia ou na Argentina (eles descobriram o seu jeito, merecem aplausos) fora da cartilha  hollywoodiana (que é claro, tem seu valor mas nem eles aguentam mais a pressão da indústria).



Agora, quanto ao carnaval... prefiro ouvir o tal bom e velho  rock’n roll (o velho, porque o que está sendo feito hoje a indústria da música também conseguiu transformar em lixo). Ah, sim: e eu fiquei muito feliz com a volta do Bowie! É um refresco no meio de tudo isso.


*O documentário ‘A todo Volume”, mostra um pouco dessa história de um jeito diferente (a visão de três guitarristas geniais: Jimmy Page é um deles). Recomendo.


** Bom, um grande entendido de samba, carnaval e cia - Zeca Pagodinho, em entrevista para a Folha -  decretou que o carnaval morreu... Quem sou eu pra discordar?


*** Vivo lendo matérias nas quais atores, diretores e etc. falam do quanto anseiam por boas histórias e o quanto são obrigados a nivelar por baixo para fazer dinheiro com seus filmes. Ainda bem que o Robert Redford criou o Festival de Sundance, dali tem saído coisas boas.


**** A natureza sempre me fez achar que discussões em torno de carnavais, renúncias do papa ou de quem quer que seja e etc. são uma grande perda de tempo. Essa fotografia aí de cima (porque eu precisava colocar alguma coisa aqui rs) me fez pensar nisso. 

O lugar? Sul das Minas Gerais.